Os instrumentos de fiscalização foram defendidos durante seminário sobre o tema ontem, segunda, 28, na sede da APMS
A existência de uma comissão de declaração e a necessidade da presença do candidato para confirmar sua autodeclaração, preenchida durante inscrição em concurso público como negro, foram medidas defendidas no seminário “A fiscalização das cotas raciais no âmbito do concurso público”, ocorrido na tarde de ontem, segunda, 28, na sede da APMS (centro) e com o apoio desta entidade.
O evento, organizado pela Procuradoria Geral do Município, teve também apoio da Secretaria da Reparação e integrou calendário proposto pelo Município para a campanha “Novembro da Igualdade”, que marca o mês da consciência negra em Salvador, e faz parte do Programa de Combate ao Racismo Institucional (PCRI).
Após abertura e boas vindas dos procuradores do município Lilian Oliveira de Azevedo Almeida e Felipe Santiago, membros do comitê técnico do PCRI, na presença da procuradora-geral, Luciana Rodrigues Lopez, e da presidente da APMS, Lisiane Guimarães, os palestrantes fizeram suas abordagens, com perspectivas complementares a respeito do racismo institucional. Todos, no entanto, concordaram na necessidade de se efetivar como instrumento de fiscalização a comissão de declaração e, no processo de sua atuação, a presença física do candidato.
Os palestrantes se manifestaram favoráveis à autodeclaração, instrumento internacional que é utilizado na maioria dos concursos e preenchido pelo candidato para concorrer à vaga como cotista. Acordaram que este instrumento tem um valor simbólico importante, de autorreconhecimento, mas não é suficiente para garantia da efetividade da política de combate ao racismo institucional, já que muitas situações, em processos seletivos, vêm detectando a ausência das características fenotípicas, previstas em lei, que asseguram o direito às vagas para a população afrodescendente. “Cerca de 30% das declarações são falsas. No Brasil, a proporção de brancos ocupando vagas de negros por cota é grande”, disse a socióloga Marcilene Gar cia de Souza ao apresentar números que, para ela, são os marcos de diferenciação da população negra, como os salários e a ocupação de cargos em serviços públicos.
Já a promotora Lívia Vaz alertou para o aspecto da subjetividade, que acaba se abrindo para o sistema de Justiça quando não é prevista a comissão de declaração nos editais. “O que determina se a pessoa é negra ou não, são os critérios de fenotipos. Se a pessoa é negra ou não, diz muito mais a respeito sobre como ela é vista pela sociedade do que como ela se vê”.
Lívia defendeu o questionamento presencial dos candidatos pelo sistema de cotas e criticou análises que são feitas, em alguns certames, por foto apenas (dados os recursos de imagem que podem ser utilizados), bem como defendeu a revisão dos questionários, que são falhos e até mesmo, a sua não-aplicação. Para a promotora, representantes dos movimentos sociais devem integrar estas comissões para garantir o controle social das decisões.
O procurador do município Francisco Bertino também defendeu a conferência presencial como meio de dar transparência aos concursos. “A cota é uma questão de humanidade. Tudo isso que discutimos aqui cai na grande questão do século XXI, nossa incapacidade de nos enxergarmos pelo que nós somos”.
A secretária da Reparação, Ivete Sacramento, encerrou a programação destacando aquele ser um momento especial por reunir os procuradores para discutir o tema. “Se os senhores não acreditarem nesse processo não conseguirão êxito. Este é um dos momentos mais importantes para o combate ao racismo institucional por Salvador. Temos o futuro de outras pessoas em nossas mãos e o grau de comprometimento dos procuradores é emocionante”.
Apresentação teatral e de dança de estudantes que integram a Onirê Companhia de Teatro, dirigida por Lázaro Machado, trouxe à tona, na voz e gestos das crianças, as principais motivações para se criar uma política de combate ao racismo e se ter a mesma efetivada no Estado e no país.